Em Busca do Amor Verdadeiro


Vivia bem na vida, perdida em vãs paixões, me enganando como podia. Então, alguém falou de um tal de Amor, palavra tão arcaica que demorei para encontrar quem me explicasse do que se tratava e, mesmo assim, pouco soube dizer. Sempre caminhando sozinha, sem raízes, resolvi encontrar esse tal de Amor, que diziam ser a maior riqueza de um ser humano. Vesti-me com a mais bela formosura e segui os caminhos indicados. Mas... para meu desencanto, só encontrei novas paixões, pseudos amores, nada igual ao que imaginava.
---- Tem que se entregar, ir mais longe, acreditar. - aconselharam.
Eu, mulher de pouca fé, coloquei a mochila nos ombros disposta o Amor encontrar. Caminhei pelas veredas, pelos becos, pela noite, pelas praças, até onde eu jamais pensaria entrar... lá estava eu, indagando sobre o Amor: algumas pessoas riam, outras olhavam desconfiadas, algumas nem faziam idéia do que eu estava falando... poucas me incentivaram a continuar a procurar, alegando não existir bem mais precioso.
Empolgada, novamente me pus a caminhar. Numa verde planície, resolvi descansar. Uma mulher colhia alfazemas e do meu lado sentou-se uma criança - provavelmente sua filha.
---- Ta indo pra onde, tia? – perguntou a pequerrucha.
---- Estou em busca do Amor, doce anjo, seguirei por aquela direção.
---- Ta indo pro lado errado, tia, o Amor mora do outro lado.
Olhei em direção para onde o pequeno braçinho apontou e só vi terra seca, sem vestígio de vegetação. O amor não podia morar ali – pensei, deve repousar em jardins perfumados. Sorri pra menina e piscando os olhos continuei a minha caminhada.
Lindos campos, suaves perfumes, comida abundante, bebida e música doce no ar.... ah! Agora sim – pensei, o Amor devo encontrar em terra tão privilegiada.
Doce como o paraíso, reinava uma magia, até o dia seguinte... Como num passe de mágica, tudo virava superficial da noite para o dia; doces beijos acabavam como açúcar molhado, suaves carícias se tornavam insultos vulgares... talvez o Amor não morasse ali... a cidade girava nesse círculo vicioso, ora muito mel, ora muito fel.
Cansada da rotina, peguei a mochila e novamente me pus a caminhar. Onde estaria esse bendito, chamado Amor? Um pássaro cantou e da menina da estrada lembrei: ---- Ta indo errado, tia, o Amor mora do outro lado. Novamente olhei em direção ao nada, de uma terra vazia.
Na busca do Amor, percebi que o tempo passou, a idade surgiu ainda sem raízes e minha mochila só recheada de vento. Por que um ser humano nasceria para destino tão vil? Cadê as flores que cercariam o Amor, como me disseram, as estradas de pétalas de rosa? Terra mais seca que o deserto, nem inseto parecia me fazer companhia. O calor era escaldante e o frio queimava a alma... desordenada fiquei.
Em poços de lágrimas passei muitos dias... vi nascerem fantasmas de meus pensamentos. Fui tocada pela ingratidão, beijada pela rejeição, o medo me seguiu de perto, abraçadinho com os meus temores. Zombaram de mim os coiotes, meu vestido de prata em trapos ficou. No deserto sem fim me senti um ser fraco, de conhecimentos inúteis, meus clamores pareciam em vão.
---- Maldita menina, terra mais seca nunca vi!
Lambi o pó da terra, me lavei com as reservas do pranto... em busca de um Amor cada vez mais distante. Há meses sem ter com quem conversar, comecei a delirar...
---- Eis a dona dos saberes, a mente brilhante a rastejar em busca de algo que nem sabe o que é. Parece cachorro mordendo o rabo, correndo atrás de quem não te quer nem um carinho te dá.
---- Segue, filha, consegue o deserto atravessar, o Amor é o mais digno dos sentimentos, mas não é fácil buscar, tem inimigos a espreita, querendo devorar.
---- Vai insana nesta busca sem fim, queima teus pés no desprezo, olhas teu coração em pedaços, vai novas cicatrizes buscar, para na cova contar.
---- O Amor é um bem precioso, só o recebe quem por ele luta. Supera teus medos, rasga teu coração, sangra até a última gota para a semente brotar.
---- Tolos os que buscam tal sentimento, pois nessa vida ninguém é de ninguém, amores existem aos montes, uns vem e outros vão.
Como uma brisa num jardim tão quente, uma voz me sussurrou:
---- Com a alma ferida, fica mais fácil enxergar, comparar os valores. Este deserto em que se encontra é o caminho para o Amor, mas poucos sabem atravessar. Pega tua mochila e decide se deve parar. O pântano lá na frente é muito mais denso, tua alma vai querer comprar. Tens a escolha de dar meia volta e aos pastos verdes retornar...

A verdade traz felicidade


Nem sempre admitimos que estamos feridas ou magoadas. O orgulho, na maioria das vezes, camufla a realidade. Ele abafa o caso - como se costuma dizer -, mesmo que, por dentro, estejamos fervendo. É aí que mora o perigo.

Quando tentamos esconder o que estamos sentindo e procuramos demonstrar uma tranquilidade que não existe, uma paz que não é verdadeira, só pioramos a situação. Toda dor precisa ser dividida e colocada para fora. Expor os sentimentos significa ser honesta consigo mesma. Traz alívio, conforto, paz e até felicidade!

A mágoa, o ressentimento e a amargura são alimentados por esse orgulho de não querer demonstrar fraquezas, dores e decepções. Esses sentimentos ganham força e transformam nossa vida em algo realmente triste e sem esperança. Por isso, fale sempre o que pensa e o que sente, especialmente para quem te chateou.No início, a franqueza e a lealdade podem até custar a incompreensão. Porém, depois você percebe que essa é a porta de entrada para um recomeço feliz. Experimente colocar a verdade em sua vida: tudo terá mais significado. Você vai ver!

Ensinar


Deus costuma usar a solidão
Para nos ensinar sobre a convivência.
Às vezes, usa a raiva para que possamos
Compreender o infinito valor da paz.
Outras vezes usa o tédio, quando quer
nos mostrar a importância da aventura e do abandono.
Deus costuma usar o silêncio para nos ensinar
sobre a responsabilidade do que dizemos.
Às vezes usa o cansaço, para que possamos
Compreender o valor do despertar.
Outras vezes usa a doença, quando quer
Nos mostrar a importância da saúde.
Deus costuma usar o fogo,para nos ensinar a andar sobre a água.
Às vezes, usa a terra, para que possamos
Compreender o valor do ar.
Outras vezes usa a morte, quando quer
Nos mostrar a importância da vida.

Travessia


"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas ...

Que já têm a forma do nosso corpo ...

E esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aosmesmos lugares ...

É o tempo da travessia ...

E se não ousarmos fazê-la ...

Teremos ficado ...

para sempre ...

À margem de nós mesmos..."

Encerrando ciclos


Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final...

Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver.

Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos. Não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos da vida que já se acabaram.

Foi despedida do trabalho? Terminou uma relação? Deixou a casa dos pais? Partiu para viver em outro país? A amizade tão longamente cultivada desapareceu sem explicações? Você pode passar muito tempo se perguntando por que isso aconteceu....

Pode dizer para si mesmo que não dará mais um passo enquanto não entender as razões que levaram certas coisas, que eram tão importantes e sólidas em sua vida, serem subitamente transformadas em pó. Mas tal atitude será um desgaste imenso para todos: seus pais, seus amigos, seus filhos, seus irmãos, todos estarão encerrando capítulos, virando a folha, seguindo adiante, e todos sofrerão ao ver que você está parado. Ninguém pode estar ao mesmo tempo no presente e no passado, nem mesmo quando tentamos entender as coisas que acontecem conosco. O que passou não voltará: não podemos ser eternamente meninos, adolescentes tardios, filhos que se sentem culpados ou rancorosos com os pais, amantes que revivem noite e dia uma ligação com quem já foi embora e não tem a menor intenção de voltar. As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas realmente possam ir embora...

Por isso é tão importante (por mais doloroso que seja!) destruir recordações, mudar de casa, dar muitas coisas para orfanatos, vender ou doar os livros que tem. Tudo neste mundo visível é uma manifestação do mundo invisível, do que está acontecendo em nosso coração... e o desfazer-se de certas lembranças significa também abrir espaço para que outras tomem o seu lugar.Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se. Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos.

Não espere que devolvam algo, não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu gênio, que entendam seu amor. Pare de ligar sua televisão emocional e assistir sempre ao mesmo programa, que mostra como você sofreu com determinada perda: isso o estará apenas envenenando, e nada mais. Não há nada mais perigoso que rompimentos amorosos que não são aceitos, promessas de emprego que não têm data marcada para começar, decisões que sempre são adiadas em nome do "momento ideal". Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará!

Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo, sem aquela pessoa - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade.

Pode parecer óbvio, pode mesmo ser difícil, mas é muito importante.

Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida.Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é. Torna-te uma pessoa melhor e assegura-te de que sabes bem quem és tu próprio, antes de conheceres alguém e de esperares que ele veja quem tu és..

E lembra-te:

Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão

Ser mulher


Ser mulher é viver mil vezes em apenas uma vida,
é lutar por causas perdidas e sempre sair vencedora,
é estar antes do ontem e depois do amanhã,
é desconhecer a palavra recompensa
apesar dos seus atos.
Ser mulher é caminhar na dúvida cheia de certezas,
é correr atrás das nuvens num dia de sol
e alcançar o sol num dia de chuva.
Ser mulher é chorar de alegria
e muitas vezes sorrir com tristeza,
é cancelar sonhos em prol de terceiros,
é acreditar quando ninguém mais acredita,
é esperar quando ninguém mais espera.
Ser mulher é identificar um sorriso triste
e uma lágrima falsa,
é ser enganada e sempre dar mais uma chance,
é cair no fundo do poço e emergir sem ajuda.
Ser mulher é estar em mil lugares de uma só vez,
é fazer mil papeis ao mesmo tempo,
é ser forte e fingir que é frágil pra ter um carinho.
Ser mulher é se perder em palavras
e depois perceber que se encontrou nelas,
é distribuir emoções que nem sempre são captadas.
Ser mulher é comprar, emprestar, alugar,
vender sentimentos, mas jamais dever,
é construir castelos na areia,
vê-los desmoronados pelas águas
e ainda assim amá-las.
Ser mulher é saber dar o perdão,
é tentar recuperar o irrecuperável,
é entender o que ninguém mais conseguiu desvendar.
Ser mulher é estender a mão a quem ainda não pediu,
é doar o que ainda não foi solicitado.
Ser mulher é não ter vergonha de chorar por amor,
é saber a hora certa do fim,
é esperar sempre por um recomeço.
Ser mulher é ter a arrogância de viver apesar dos dissabores,
das desilusões, das traições e das decepções.
Ser mulher é ser mãe dos seus filhos
e dos filhos de outros e amá-los igualmente.
Ser mulher é ter confiança no amanhã
e aceitação pelo ontem,
é desbravar caminhos difíceis em instantes inoportunos
e fincar a bandeira da conquista.
Ser mulher é entender as fases da lua
por ter suas próprias fases.
É ser "nova" quando o coração está a espera do amor,
ser "crescente" quando o coração está se enchendo de amor,
ser cheia quando ele já está transbordando de tanto amor
e minguante quando esse amor vai embora.
Ser mulher é hospedar dentro de si o sentimento do perdão,
é voltar no tempo todos os dias
e viver por poucos instantes coisas
que nunca ficaram esquecidas.
Ser mulher é cicatrizar feridas de outros
e inúmeras vezes deixar as suas próprias feridas sangrando.
Ser mulher é ser princesa aos 20,
rainha aos 30, imperatriz aos 40
e especial a vida toda.
Ser mulher é conseguir encontrar uma flor no deserto,
água na seca e labaredas no mar.
Ser mulher é chorar calada as dores do mundo
e em apenas um segundo já estar sorrindo.
Ser mulher é subir degraus
e se os tiver que descer não precisar de ajuda,
é tropeçar, cair e voltar a andar.
Ser mulher é saber ser super-homem quando o sol nasce
e virar cinderela quando a noite chega.
Ser mulher é ter sido escolhida por Deus
para colocar no mundo os homens.
Ser mulher é acima de tudo um estado de espírito,
é uma dádiva,
é ter dentro de si um tesouro escondido
e ainda assim dividi-lo com o mundo!
Silvana Duboc

Libertação



Cansei de ser ninho, de ser só abrigo.
Eu quero ser ave, levantar meus vôos,
Cruzar o espaço, descortinar horizontes,
Buscar outros ninhos para me abrigar.

Cansei de ser porto, ser sempre chegada.
Eu quero ser barco, levantar âncoras,
Singrar outros mares, provar novas águas,
Buscar outros portos, por onde aportar.
Cansei de ser platéia, apenas ouvinte.
Eu quero ser palco, mostrar-me na luz,
O próprio espetáculo, cenário e festa,
Fazer de mim mesma o espetáculo maior.
Cansei de calar, de ser só espera.
Eu quero gritar, mostrar o que sou,
Receber da vida o que é meu, por direito,
Quebrar meus grilhões, ser livre, VIVER!

Eu vivi e ainda vivo!!!


Eu cresci, amadureci, quis ser criança novamente mas não pude.

Respeitei, de todas as formas eu amei . . . no final me descobri.

Te encontrei, com um sorriso me encantou, e com uma troca de olhares me perdi.

De todas as coisas que eu encontrei dentro de mim, busquei uma que se comparasse com aquele momento

Eu amei . . . Me encontrei, confiei, de todas as formas eu me entreguei.

Correspondi, imaginei, com apenas duas palavras ( te amo ) eu viajei.

E por mais que eu não quisesse,

Me apaixonei . . .

Percebi que meus sentimentos não estavam sendo correspondidos,

Dor, sofrimento, sorrisos insanos, olhares vazios, eu sofri. . .

Demorei para perceber que estava colocando prioridades em pessoas que me viam como uma simples opção

Eu caí, percebi que o fundo do poço era meu destino

Relutei, não quis aceitar tal destino, me fiz de forte quando a dor era tamanha

Eu chorei . . .

Você não quis mais, não aceitei, me desesperei, me ultrapassei, eu me apaguei.

E com todos aqueles sentimentos perdidos dentro de mim

Me perdi . . . Com o tempo percebi que eu era muito mais do que aquilo que você via

Eu sou muito mais do que você merecia

Você perdeu, se arrependeu, quis usar aquele olhar novamente, mas eu não era mais a mesma.

Eu cresci. . .

Mereço mais do que aquilo que imagino,

Eu sou mais do que aquilo que as pessoas viram

Eu amei, me apaixonei, eu sofri, eu chorei, me perdi . . .

no final eu cresci.

Posso olhar para trás e dizer : Eu vivi e ainda vivo!!!

"Deixa estar que o que for pra ser vigora."


O resto das coisas, eu me digo baixinho, você ainda tem todo o resto das coisas.
Para não enlouquecer sem você, eu me agarro àquela lembrança desfocada e amarelada de que existe vida lá fora, e me pego tentando lembrar, com um esforço que quase me faz esquecer você por alguns segundos, o que seriam mesmo essas coisas.
O que sobra quando você sai é um dia claro que me pede para dar um passo, apenas um passo. Mas eu fico dura que nem pedra para não desmontar e me espalhar pelo mundo.
Não quero sujar nosso amor com a minha mania de amar despedaçada e esfarelada.
Eu endureço e esqueço o resto das coisas, porque quero ficar toda inteira pra quando você me quiser de volta.
Tenho medo do vento que passa arrancando partes de mim e das pessoas que me envenenam, matando partes de mim. Não quero ouvir ninguém, não quero saber de nada, não quero sentir nada. Quero esperar você voltar reta e dura como uma estátua, porque tenho medo de me espalhar pelo mundo e nunca mais ser sua.
Imagine se, por causa daquele longo adeus que eu dei e que nunca mais acabou, porque o adeus definitivo dói demais, você volta e me encontra sem as mãos? Imagine se você me encontra sem joelhos porque resolvi contar a Deus o quanto ainda confundo amor com escravidão? Imagine só você me encontrar sem fígado, porque você mesmo o deixou naquele pote estranho em cima do móvel da cozinha enquanto me contava coisas que eu não queria saber?
Não posso ser uma mulher incompleta, tem tanto amor dentro de mim que, mesmo eu sendo inteira, quase já não cabe. Mas se eu der um passo, um passo apenas, eu vou deixar um rastro do que eu fui pra você e você vai querer voltar pra casa como um cachorrinho fiel, mas não vai mais ter casa. Então eu cerro os olhos, trinco os dentes, fecho os punhos, engulo o ventre e espero você chegar, porque só você me vira do avesso sem perder nenhum grão de mim.
O resto das coisas do mundo quer sempre fazer trocas, o resto me dá vida, mas quer sempre meus pedaços.
E eu acho uma traição sair por aí dando pedaços do meu pulmão para ares mais leves, pedaços do meu coração para risos mais despretenciosos, pedaços do meu umbigo para momentos de altruísmo.
A vida fica surda sem você, porque o volume do mundo abaixa para ouvir meu grito interno. O mundo fica passando como um filme Super Oito na parede, as pessoas estão felizes demais, mas parece que faz tempo demais e sentido nenhum. Sem você sinto essa felicidade sem som, como se, por maior que fosse um sentimento, ele já nascesse com defeito.
Eu sei que as ruas vão continuar com seus lixos, seus cinzas e suas possibilidades de destino. Eu sei que a poeira vai continuar dançando em volta do meu lustre enquanto eu tento me concentrar em duas ou três frases de um livro qualquer.
Eu sei que eu posso muitas coisas sem você, e eu sei que, se eu tomar um banho quente e comprar uma roupa nova, talvez eu possa querer uma coisa que seja, só uma, sem você. Nada muda no mundo quando você não caminha ao meu lado, as pessoas quase não percebem que falta metade do meu corpo e que eu não posso ser muito simpática porque toda a minha energia está concentrada para eu não tombar.
Os cachorros cheiram outros mijos, as pessoas estranhas fazem exercícios apertando as mãos levantadas para cima, alguns homens de terno insistem em usar óculos de surfistas como se fossem o super-homem que deixa aparecer um pedaço do S no peito. Ninguém deixa de espreguiçar só porque você não está aqui, ninguém deixa de molhar a torrada no café e de falar com voz idiota enquanto boceja.
E eu odeio o mundo por isso, eu acho o mundo muito medíocre, eu tenho pena de todas essas pessoas que não sabem o que é encaixar o rosto no vão das suas costas e querer ser embalsamado ali por mil anos. Amor de verdade não acaba, é o que dizem, mas eu tenho medo. Eu tenho medo de quantos mijos, bocejos, cinzas e óculos de surfistas eu ainda vou ver sem você, eu tenho medo dos meus pedaços espalhados pelo mundo, eu tenho medo do vento passar enquanto eu estou míope, e eu ficar míope pra sempre.
Eu tenho medo de tudo isso apagar e o vento levar suas cinzas, desse fogo todo ser de palha, como dizem. Da dor que se dissipa a cada respirada mais funda e cheia de coragem de ser só. Eu tenho medo da força absurda que eu sinto sem você, de como eu tenho muito mais certeza de mim sem você, de como eu posso ser até mais feliz sem você.
Pra não pensar na falta, eu me encho de coisas por aí. Me encho de amigos, bares, charmes, possibilidades, livros, músicas, descobertas solitárias e momentos introspectivos andando ao Sol. E todo esse resto de coisas deixa ao pouco de ser resto, e passa a ser minha vida, e passa a enterrar você de grão em grão, sujando seus dentes e olhos e nada eu posso com a pá que está na minha mão.
O vento está mais forte do que o vidro que eu fiz com os meus próprios grãos para me guardar para você. Ele está esmurrando a porta, escapando pelas frestas e eu gosto da brisa fina na minha testa aliviando o meu tormento. Mas lembrar de você ainda tem o poder de congelar a natureza, de estancar a fresta aberta.O resto das coisas continua encapado por um plástico vagabundo, pedindo que eu espere mais um pouco para rasgar tudo e voltar."